domingo, 26 de agosto de 2012

Artista da vez - TEARS FOR FEARS



país: Inglaterra
gênero: pop rock, new wave, synthpop
integrantes:
Roland Orzabal (vocal e guitarra)
Curt Smith (vocal e baixo)

histórico: Uma das duplas mais emblemáticas surgidas nos anos 80, o Tears For Fears conseguiu um feito inédito: deu mais dinheiro ao escritor norte-americano Arthur Janov do que John Lennon. A história é simples: a dupla britânica, assim como o ex-líder dos Beatles, era adepta da teoria do Grito Primal desenvolvida por Janov, que consistia em um tratamento para doenças mentais que envolvia o paciente a relembrar, expressar e sentir dores de infância reprimidas há muito tempo. E o escritor confessou ficar admirado quando viu sua conta receber generosas somas de dinheiro de direitos autorais. Só por isso, o Tears For Fears já merecia uma matéria. Mas além disso, eles fizeram grandes músicas, especialmente nos dois primeiros discos, quando emplacaram sucessos como “Pale Shelter” e “Shout”. O sucesso ficou ainda maior quando explodiram com o disco “The Seeds Of Love”, que também rendeu inúmeras críticas e gozações por plagiarem os próprios Beatles. Reza a lenda que até Paul McCartney entrou na brincadeira, pedindo co-autoria para ele e Lennon nas músicas.

Uma banda que utiliza conceitos tão estranhos como o Tears For Fears usou é algo raro na história do rock. E o próprio nome é tirado da filosofia do Grito Primal: trocar medos por lágrimas.

O duo formado por Curt Smith e Roland Orzabal sempre teve uma postura séria até demais para um duo pop e que calcou suas músicas nas neuroses e até por isso foram meio ridicularizados. Aliás, no Brasil, o nome foi abrasileirado para “tias fofinhas”, o que provocou caretas na dupla quando vieram para cá e souberam qual seria a tradução em inglês: “Fluffy aunts? Que merda é essa?”, perguntou Roland, à época.

Roland Orzabal conheceu Curt Smith por volta de 1975, em Bath, onde os dois nasceram, através de um amigo em comum, Paul. Logo ficaram amigos e inseparáveis. Certa vez, Curt presenteou Roland no Natal com três violinos que havia roubado da escola. Para não deixar o amigo magoado, Roland resolveu aprender a tocar o instrumento.

Roland resolveu então montar um dupla folk com um colega chamado Busar, e depois convenceu Curt a entrarem em outra banda chamada Neon, já que ele gostava da voz de seu melhor amigo. Em 1979 resolveram montar um outro grupo, The Graduate.

The Graduate era um quinteto com John Baker, Andy Marsden e Steve Buck. Com um visual copiado dos Beatles do início de carreira e títulos ingênuos como “Elvis should play ska”, o Graduate lançou o lp “Acting My Age” e não fez sucesso algum. Por muito tempo, Curt e Roland preferiam não falar de seu passado. Ao menos, o título premonitório, "agindo conforme minha idade", fazia sentindo, com garotos que tinham idade média entre 17 e 19 anos.

Logo, Curt e Roland resolveram mudar de vida. Nessa época, Roland fazia terapia inspirada no Grito Primal de Janov e surgiu daí toda a influência para montar o grupo.

Em 1981 conheceram o baterista Manny Elias e o tecladista Ian Stanley. Assim, nascia o Tears For Fears. O grupo começou a fazer pequenos shows e mandar demos até conseguir um contrato com a Mercury.

Em 1982, assinam contrato para a gravação de seu primeiro disco. Com músicas assinadas apenas por Roland Orzabal, o grupo lança “The Hurting”, que fez um enorme sucesso em 1983. Três canções do disco bateram no top 10 inglês: “Mad World”, “Change” e a clássica “Pale Shelter”. O disco já trazia elementos da influência de Janov, especialmente na canção “Idea As Opiates”. Para a capa do disco escolheram um pequeno garoto de Bath, conhecido como Gebby.

Roland lembra que a gravação do disco foi extremamente tensa para os integrantes: “Nós o gravamos basicamente nos estúdios Abbey Road e trabalhávamos sete dias por semana até duas ou três da manhã. Foi um disco difícil e que gerou muita tensão. Tivemos sorte que o primeiro single, “Mad World”, vendeu bem e isso ajudou muito. Ele foi muito inspirado em Arthur Janov e na sua terapia do Grito Primal. De fato, “Ideas As Opiates” e “The Prisoner” foram roubados de alguns capítulos do seu livro.”

“The Hurting” colocou o Tears no meio de um mundo de bandas new wave, que faziam um uso imenso de sintetizadores e baterias eletrônicas. Logo, a banda começou a fazer shows seguidos pelo país. E, em meio a uma imensa turnê, os dois começaram a escrever, em conjunto, as músicas do novo disco. Curiosamente, embora nos créditos o grupo fosse formado por quatro pessoas, nas capas e shows os destaques eram apenas Curt e Roland.

E as pressões aumentavam, como lembra Roland: “Conforme o sucesso ia sendo maior, o número de apresentações era crescente e não tínhamos tempos para parar e pensar um novo disco. Apenas tínhamos que fazê-lo. Para piorar, os executivos da gravadora pediram que diminuíssemos nosso purismo com eletrônica e adicionássemos mais elementos de rock em nossas canções. Aceitamos o pedido e lançamos um disco mais simples”.

Ao mesmo tempo que fizeram um disco mais simples, fizeram também um trabalho que conquistou os dois cantos do Atlântico. “Songs From The Big Chair”, lançado em 1985, foi um clássico dos anos 80 e rendeu inúmeros sucessos, como “Shout”, “Head Over Heels”, “Mother's Talk” e “Everybody Wants To Rule The World”, a primeira canção do grupo a ser número um na Europa e nos Estados Unidos.

O título do disco foi tirado do livro Sybil, que depois rendeu um filme televiso estrelando Sally Field, como uma mulher que tem personalidade múltipla e só se sente à vontade na cadeira de seu analista, que ela chama de big chair. O grupo lançou uma canção no lado B do single de “Shout”, chamada “Big Chair”, onde fazem música para trechos do filme, contendo a voz da atriz.

A década de 80 foi pródiga em ter várias duplas - Soft Cell e Eurythmics talvez duas das mais relevantes. Mas Roland e Curt ficavam furiosos quando comparavam o sucesso de sua banda com o de outra dupla inglesa - o Wham!, estrelado por George Michael. “É um absurdo sermos catalogados igual ao Wham! Eles fazem música descartável, horrenda, para as adolescentes ficarem berrando. Eles representam o lixo. Nosso trabalho é sério, nossas letras falam de neuroses, de problemas. Eles são muito mais bonitos e ganham mais dinheiro do que nós, mas não me importo com isso. Eu quero que minha música deixe uma mensagem aos fãs”, berrava Roland.

Foi entre 1985 e 1986 que Janov chegou até a procurar a dupla para agradecer o reforço orçamentário. Janov que já havia inspirado a John Lennon - a canção “Mother” é fortemente influenciada pelo trabalho do psiquiatra - disse que ficou surpreso com tamanho dinheiro. Em “Songs From The Big Chair”, a canção mais ligada a Janov é o sucesso “Shout”, com o refrão “Grite/Grite/Ponha tudo para fora/Vamos lá/Estou falando com você...”.

E entre 1985 a 1988 a banda não fez outra coisa do que excursionar e ganhar milhões de dólares. Roland conta que foi muito difícil lidar com a pressão nesse período. “Nós não estávamos preparados para tamanho sucesso e para a histeria que aconteceu. Eram pessoas nos seguindo, centenas, milhares de entrevistas com as mesmas perguntas. Tocar todas aquelas canções durante aquele período foi quase uma tortura. Eu e Curt precisávamos de um tempo para que pudéssemos reavaliar nossa vida e nossa carreira.”

E durante três anos, Roland fez psicoterapia, explorando seu passado e escrevendo canções totalmente diferentes dos dois discos anteriores. “Eu não queria mais soar como uma banda que utilizava a eletrônica, eu queria romper com tudo isso, romper com o próprio culto sobre nós. Resolvi resgatar antigos discos dos Beatles, Steely Dan, Pink Floyd e tentei fazer algo bem ambicioso, grandioso.”

O resultado de tudo isso foi “The Seeds Of Love”, de 1989, um disco que fez mais sucesso que “Songs From The Big Chair”.

Roland e Curt caíram de vez no passado dos Beatles e pagaram caro por isso. O disco trazia grandes sucessos, como as faixas “Advice For The Young At Heart”, “Sowing The Seeds Of Love” e “Woman In Chains”, estrelando a cantora Oleta Adams, que fez tanto sucesso que seguiu uma carreira independente. Mas o disco foi duramente criticado por se aproveitar de idéias alheias, particularmente dos Beatles da fase Sgt. Pepper's.

A gozação ficou tão séria que até Paul McCartney brincou com isso, dizendo que estava tentando reatar amizade com Yoko Ono para que os dois pedissem a Curt e Roland uma co-autoria nas canções para ele e John Lennon. Mas a pressão foi tão grande que acabou resultando na saída de Curt Smith da banda, em 1990. Curt não aguentava mais os problemas decorrentes do sucesso e resolveu mudar para Nova Iorque por um tempo.

“Tudo se tornou um enorme sucesso e a pressão sobre nós era desumana. Eu estava infeliz e saí por pura infelicidade. Meu casamento estava acabando e queria fugir da Inglaterra e escolhi morar em Nova Iorque, um ótimo lugar porque ninguém esta aí para ninguém e você pode viver uma vida anônima. Foi lá que tinha conhecido uma nova mulher, tinha me apaixonado e por isso quis me mudar. Basicamente, eu queria ter uma outra vida. E, dessa maneira, o Tears For Fears não poderia continuar”.

Uma curiosidade: no meio de "Sowing The Seeds Of Love", o grupo berra “Kick out the style! Bring back the jam!”. A referência se faz a Paul Weller, então líder do The Jam, um grupo nascido na safra punk e que se notabilizou pelo cunho político. Em 1982, após lançarem o disco “The Gift”, Weller dissolveu o trio e formou, com o desconhecido tecladista, uma dupla chamada The Style Council, que falava das mesmas coisas, mas ao som de jazz, soul e até bossa nova. Muitos fãs jamais perdoaram Weller por matar o Jam e criar o Style. E, ao que parece, Curt e Roland faziam parte dessa legião.

A última apresentação dos dois juntos foi em 30 de junho de 1990, no Knebworth, em um show para arrecadar fundos. Assim, os dois se separam, mas Roland conseguiu manter o nome em seu poder.

Em 1992 a gravadora resolveu lançar a coletânea “Tears Roll Down: Greatest Hits 1982-1992”. No ano seguinte Roland se junta a Alan Griffiths e lança “Elemental”, quarto disco do Tears For Fears. Roland tentou evitar de qualquer maneira a superprodução do disco anterior e conseguiu ir bem nas paradas com “Break It Down Again”.

Em 1995, Roland lança o disco “Raoul And The Kings Of Spain”, segundo ele mesmo afirma, seu disco favorito. Ele confessa que esse seria o título do disco “The Seeds Of Love”, o que só não aconteceu por causa do single “Sowing the Seeds Of Love”. Raoul é nome de um de seus filhos e a canção já era tocada em shows.

Em 1996 é a vez de “Saturnine Martial & Lunatic”, que não fez sucesso algum. E foi por causa desse disco que Roland resolveu acabar com o Tears, após um show na Colômbia. “Estávamos excursionando e não fazíamos sucesso no país desde 1983 e por isso fui obrigado a cantar músicas do “The Hurting”. Fiquei tão humilhado que após a turnê pela América do Sul, resolvei encerrar o grupo”.

Nesse mesmo ano, Curt casa pela segunda vez e monta um novo grupo, Mayfield, que lança um disco com o mesmo nome, em 1997, pelo selo Zerodisc. Em 2000, os dois voltam a se encontrar e anunciam que pensam em voltar ao Tears For Fears. Enquanto isso não acontece, Roland lança um disco solo chamado “Tomcats Screaming Outside”. E, em 2004, os dois anunciam o retorno com um novo disco, “Everybody Loves a Happy Ending”, que segundo eles, seria a continuação de “The Seeds of Love”.

Curt conta que a volta foi lenta, mas era inevitável. “Eu não estava feliz com minha vida profissional. Tinha feito um disco sozinho, que eu odeio, e quando reencontrei Roland, começamos a conversar. Quando saí da banda foi mais por uma atitude de mostrar que eu podia viver sem ele do que outra coisa, afinal estávamos juntos há mais de 15 anos. Como sempre tivemos negócios ligado à banda, ainda nos víamos, até que resolvemos conversar e ver o que poderia acontecer”.

Atualmente, eles seguem firmes e tocando pelo mundo afora, sem perspectivas de um novo álbum. Espera-se novos capítulos dessa banda histórica. E quando eles aparecerem por aqui, nada de perguntar pelas tias deles, certo?

domingo, 5 de agosto de 2012

Michael Phelps, uma lenda ante nossos olhos



Costuma-se chamar de lenda uma narrativa fantasiosa, com um caráter fantástico e fictício, combinando fatos reais e históricos com fatos irreais que são meramente um produto da imaginação aventuresca humana. Adiciona-se elementos como as explicações plausíveis para os acontecimentos misteriosos ou sobrenaturais. Seria fácil iludir nossos ouvintes, e eles estariam prontos para acreditarem em tudo, basta o fato ter ocorrido em um passado onde ele não viveu. Fale de Jesse Owens ou de Larissa Latynina. Cite Carl Lewis e relate os feitos obtidos por Paavo Nurmi. Não se esqueça de contar a histórica nota 10 de Nadia Comaneci ou o recorde incrível conseguido por Mark Spitz. Todos lendas do esporte, porque estão no passado. Se for hoje em dia parece que não vale muito, parece banal demais chamar um atleta atual de o maior de todos os tempos. Por que?

Privilegiados serão aqueles que viverão daqui 50 anos ou mais. Eles irão ouvir a história de um nadador orelhudo que simplesmente se tornou o maior medalhista olímpico de todos os tempos. Um cara que conquistou 22 medalhas em três edições olímpicas (18 de ouro, 2 de prata e 2 de bronze), apesar de ter disputado quatro. Isso se ele realmente se aposentar depois dos Jogos Olímpicos de Londres 2012, aos precoces 27 anos. Um cara que até fez alguma besteira em sua vida pessoal, como por exemplo ser flagrado publicamente fumando um cigarro de maconha. Ele é uma lenda, como hoje são lendas Jesse Owens, Larissa Latynina, Carl Lewis, Mark Spitz e tantos outros. Exatamente porque quando é do passado, às vezes em preto e branco, parece mais fácil acreditar. Por todas as características que envolve uma lenda. Mas essa lenda é mais real do que qualquer outra, ela acontece diante de nossos próprios olhos e precisamos aceitar, entender e acima de tudo contemplar esses feitos extraordinários de Michael Phelps. E por que muitos não aceitam, como, por exemplo, o ex-atleta britânico Sebastian Coe?

Talvez seja pela forma de como a imagem do atleta é conduzida na mídia. Uma atleta que esteve nas Olímpiadas de Sydney 2000, mas que aos 15 anos de idade não passou do 5º lugar nos 200m borboleta. Prova que muito pouco tempo depois estabeleceria o novo recorde mundial. Phelps foi de desconhecido à celebridade que prometia vencer tudo em Atenas 2004. Ele ganhou 6 medalhas de ouro e 2 de bronze, um resultado excelente que foi considerado um fracasso. O americano não desistiu e então viria a conseguir a inacreditável marca de 8 medalhas de ouro em uma mesma Olímpiada, em Pequim 2008, superando Mark Spitz. Mas todos só lembram que ele quase perdeu uma prova e que seu companheiro o salvou no revezamento.

Michael Phelps não quase perdeu os 200m borboleta em Pequim, ele ganhou de forma incrível. Tão incrível como foi a vitória do sul-africano Chad Le Clos contra o próprio Phelps nesta mesma prova em Londres 2012. E Jason Lezak não o salvou no revezamento, porque o revezamento é uma equipe e cada um tem o seu fator de importância fundamental. Phelps fez história quando se tornou o maior medalhista de ouro de todos os tempos e quando venceu 8 ouros na mesma edição dos jogos. Quando alguém fará isso novamente? E isso aconteceu quando ele já tinha 6 de ouro. E antes de voltar para conseguir outras de ouro, beliscou uma prata que ainda não tinha, mas perdendo de cabeça erguida, reconhecendo a superioridade do rival e compatriota Ryan Lochte. Isso o faz ser ainda maior do que já é.

Quem foi lenda sempre continuará sendo lenda. Quem foi grande continuará sendo grande. Quem marcou seu nome na história nunca o verá ser apagado dela. E quando alguém maior surgir, não temos que esperar o tempo passar para reconhecer seus feitos, para ver como ele fora incrível e marcara época em nosso próprio tempo. Michael Phelps é o maior atleta olímpico da história. E tudo depois de voltar e conseguir mais, quando todos duvidavam de suas condições e o chamavam de acabado. Isso sem falar que no Rio 2016 ainda pode marcar um retorno triunfal da lenda, para que, quem sabe, todos consigam ver e entender realmente o que está acontecendo diante de seus próprios olhos.


sexta-feira, 3 de agosto de 2012